quinta-feira, 9 de novembro de 2017

FILARMÔNICA DE GOIÁS FARÁ A PRIMEIRA GRAVAÇÃO MUNDIAL DA SINFONIA DODECAFÔNICA DE GUERRA-PEIXE


A sinfonia nº1(1946) de Guerra-Peixe terá a sua primeira gravação mundial no próximo dia 23 de novembro, pela Orquestra Filarmônica de Goiás tendo à frente o seu regente titular, o inglês Neil Thomson. O fato interessante é que a primeira audição mundial da obra também foi feita por um regente inglês, Maurice Milles que regeu a Orquestra da Rádio BBC no mesmo ano da composição. 

Agora, contaremos um pouco do contexto da composição e a técnica utilizada para compô-la.

A "Sinfonie pour petit orchestre" com o título escrito assim, em francês na partitura autógrafa, se tornou sinfonia nº1 depois que o autor resolveu interditar todas as obras escritas da chamada, "fase inicial", incluindo uma sinfonia, obra que teve uma boa acolhida na época. Então, a sinfonia nº1 passou a ser a escrita em 1946, e que pertence ao período de composição, por ele mesmo denominado "fase dodecafonismo". Durante os anos de 1944 a 1949 o autor recebia orientação sobre o dodecafonismo com Hans Joaquim Koellreuter, mestre alemão que veio para o Rio de Janeiro fugido do regime nazista.

O dodecafonismo foi criado pelo austríaco Arnold Schöenberg nos anos de 1920. Nessa técnica o compositor utiliza as 12 notas da escala cromática que ele organiza em séries. De forma estrita, um tom não pode ser repetido se não tiverem sido ouvidos todos os outros 11 tons.  Ou seja, se opõe a melodia tradicional com suas repetições que tanto agradam os ouvidos. 

Porém, dentro desse período, o autor passou por fases de maior ou menor rigidez no emprego do dodecafonismo, realizando experiências e tentando dar-lhe algum caráter nacional. Aliás, por esse motivo: a incapacidade de criar um dodecafonismo nacional fez Guerra-Peixe abandonar a técnica em 1949, aceitando um convite para ser arranjador de uma orquestra de rádio em Pernambuco. Lá, ele iria pesquisar e estudar o folclore do nordeste como nenhum outro compositor se prestou a fazer até hoje. 

Críticas sobre a sinfonia:

Em seu livro: Música Contemporânea Brasileira, lançado pela Ricordi Brasileira em 1981 o musicólogo, José Maria Neves cita um artigo de Koelreutter falando sobre a obra:



A sinfonia de Guerra-Peixe é um exemplo de que o atonalismo não é incompatível com a expressão de sentimentos, como a paixão, com a graça, com o lirismo(...). A Sinfonia de Guerra-Peixe tem o valor de um manifesto e a significação de um ato de fé nos destinos da música brasileira, erudita e popular. É uma obra ousada e revolucionária. Nesta obra como nas outras do mesmo período, a maestria com que o compositor manipula o material sonoro (tanto no plano do desenvolvimento musical quanto no plano de realização instrumental) permite-lhe exteriorizar o dramatismo e o humor satírico que se alternam em sua música.

Em 1971 o saudoso crítico do do Jornal "O Globo" comentava a obra após a execução feita pela OSB, tendo o próprio autor como regente.



É obra muito respeitável nos seus três movimentos de concepção formal neoclássica, mais ligados a Hindemith do que a Schoenberg, na sua estrutura harmônica e melódica, torturada pela série, mais vitoriosa como revelação de uma personalidade poderosa, capaz de conciliar a expressividade tradicional como a linguagem dodecafônica, sem cair no lirismo romântico de um Alban Berg.


Durante a irradiação da obra na América Latina em 24 de abril de 1947 o locutor da Rádio BBC fez os seguintes comentários sobre a sinfonia:

“É de um conteúdo altamente expressivo“.

“Guerra-Peixe tem uma técnica de composição que se compara a dos grandes compositores contemporâneos”.

“Conhece profundamente os segredos da orquestração”.

“A obra é de grande originalidade, e demonstra muita sinceridade”.

A mais recente execução da obra ocorreu no sul do país,em 2014 com a Filarmônica da UFPR sob a regência de Márcio Steuernagel em um concerto que comemorava o aniversário de nascimento do autor em 1914.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

O SOBERBO TEMA INICIAL DAS "XI VARIAÇÕES PARA O PIANO" DE KORENCHENDLER


As XII variações para o piano do compositor carioca, Henrique Dawid Korenchendler, têm um dos temas (melodia inicial) mais bonitos da literatura pianística brasileira. É realmente soberbo! Logo após a exposição, seguem as 11 variações, que como o próprio autor revelou em uma antiga entrevista para a Rádio MEC, não necessitam de bula para serem entendidas. 

No final das variações o autor nos presenteia com uma grata surpresa: faz o solista declamar a última estrofe do poema, "O Florir" de Álvaro Campos (heterônimo de Fernando Pessoa). Não dá para deixar de gritar: da capo! da capo!

A obra foi dedicada a grande pianista, Sonia Maria Vieira, que aliás, também foi a intérprete da 1ª gravação mundial. 

Por Graan Barros

O florir

O florir do encontro casual
Dos que hão sempre de ficar estranhos...

O único olhar sem interesse recebido no acaso
Da estrangeira rápida ...

O olhar de interesse da criança trazida pela mão
Da mãe distraída...

As palavras de episódio trocadas
Com o viajante episódico
Na episódica viagem ...

Grandes mágoas de todas as coisas serem bocados...
Caminho sem fim...